Nome: Dedê Ranieri
Lugar: São Bernardo, São Paulo, Brazil

View my complete profile


  • No comments. É isso que dá ter amizade com gente d...
  • Texto produzido no módulo infanto-juvenil da pós-g...
  • YellowMeu primeiro encontro com Maurice aconteceu ...
  • My Baby Just Cares For MeLiz Taylor is not his sty...
  • UMA VEZ DO LADO DE DENTRO DO CÉREBRO, DUVIDE DAS I...
  • Gente (será que ainda tem gente que entra aqui?),e...
  • Ontem foi a divulgação da oficina literária Escrev...
  • Livraria Nobel de São Caetano reúne escritoresO Nú...
  • "À meia-noite já voavam alto por uma praia de pedr...
  • Antes eu tentava explicar, mas não conseguia. Entã...



  • novembro 2005
  • dezembro 2005
  • janeiro 2006
  • fevereiro 2006
  • março 2006
  • abril 2006
  • maio 2006
  • junho 2006
  • julho 2006
  • agosto 2006
  • setembro 2006
  • outubro 2006
  • novembro 2006
  • dezembro 2006
  • janeiro 2007
  • fevereiro 2007
  • março 2007
  • abril 2007
  • maio 2007
  • junho 2007
  • julho 2007
  • agosto 2007
  • setembro 2007
  • outubro 2007
  • novembro 2007
  • dezembro 2007
  • janeiro 2008
  • fevereiro 2008
  • abril 2008
  • julho 2008
  • agosto 2008
  • setembro 2008
  • outubro 2008
  • novembro 2008
  • maio 2009
  • setembro 2009
  • outubro 2009
  • novembro 2009
  • fevereiro 2010
  • março 2010
  • abril 2010
  • maio 2010
  • junho 2010
  • outubro 2010
  • Current Posts



  • Liubliu
  • Gravataí Merengue
  • Cartas de Maracangalha
  • Brenda Walsh
  • Menina com uma Flor
  • Será que funciona?
  • Um blog como outro qualquer
    mais diferente





  • quarta-feira, maio 27, 2009

    A primeira vez que saí com você chovia aos cântaros. Eu quase não estava atrasada, só um pouquinho porque chovia muito e eu tinha medo de derrapar na pista e amassar o vestido e parecer afobada na hora da chegada. Quando você ligou eu me expliquei tentando não falar rápido demais, palavra por palavra, que era a chuva, não era desculpa, o mundo estava caindo naquele dia, você devia olhar pela janela, meu bem, olha a chuva, olha a chuva pela janela. Eu particularmente acho um charme marcar encontro em dia de chuva, acho que foi um filme, um filme nacional. Amores possíveis, já viu? Carolina Ferraz e Murilo Benício marcam um encontro no cinema num dia de muita, muita chuva, e ela não vai, e ele espera, e três histórias se desenrolam a partir daí, com três possibilidades do que poderia ter sido, do que não foi. É uma comediazinha romântica que me deixou de quatro e apaixonada por encontros em dias de chuva e pelas possibilidades, apesar de na prática odiar qualquer programa que não seja dentro de casa em dias de chuva, a chapinha meu bem, o cabelo arrepia. Mas o nosso, o nosso encontro não tinha qualquer possibilidade de dar errado no meio daquele temporal, nem com o cabelo arrepiado, vestido amassado, derrapando na pista. Alguns minutinhos de atraso, já tô chegando. E você levou um choque, pediu pra eu me atrasar ainda mais, que contava com o costumeiro atraso, ia entrar no banho, e eu inventei uma passadinha na casa da minha amiga sua vizinha, e esperei no posto de gasolina daquela avenida atrás do seu apartamento retocando batom, lendo Vejinha São Paulo e escolhendo uma nova opção para local do encontro, topo descoberto do Unique já era, como chovia, chovia muito em São Paulo, e eu fui te buscar no meio do pré-dilúvio com meu carro falhando a marcha, e acho que você tomava banho olhando a chuva pela janela com aqueles olhos pequenos que eu ainda não decifrava. Eu lia e retocava o batom e qualquer vestígio de olheira, porque os dias de chuva são péssimos para a pele e olheiras então nem se fale. Chovia tanto em São Paulo naquele dia e o tempo não passava, eu estava adiantada, adiantada pela primeira vez na vida, esperando no posto o telefone tocar, na cabeça Grace Jones cantando La vie en rose, na mão a Vejinha São Paulo, gloss pra retocar segundos antes da sua chegada. Daí você entrou no carro de jeans e camiseta vermelha e quase pisou na garrafa de saquê e queria saber porquê uma garrafa de saquê no chão do carro, sorrindo com o olho pequeno. Eu de Grace Jones na cabeça, a marcha falhando. Como chovia em São Paulo naquele dia, meu bem.

    posted by Dedê Ranieri @ 12:27 AM |


    terça-feira, maio 19, 2009

    Oficina de Escrita de Contos Infanto-Juvenis
    Coordenador: Manuel Filho

















    O Gordo da oitava

    Idade, dezesseis.

    Tem olhos profundos e claros, cabelos castanhos médios, puxando para o cinza pardacento e uma falha na sobrancelha esquerda, diria um observador mais atento.

    O nariz não é grande nem pequeno, nem bonito nem feio, normal.

    As maças do rosto são rosadas, com um aspecto saudável e vibrante, e sardas quase imperceptíveis.

    Tem a boca pequena, pequena até demais para o seu tamanho, num formato de morango simetricamente perfeito.

    Não gosta que reparem, menos ainda que comentem, mas acha que tem o umbigo saltado demais em comparação ao das outras pessoas.

    Tem 1,81 m de altura, aparentando menos, culpa da época em que se encolhia para não parecer nem mais gordo, nem mais alto.

    É carioca da Gávea e nunca explicou porque torce para o XV de Jaú, ou Esporte Clube XV de Novembro, como prefere chamar.

    Mora com o pai, a mãe, a irmã mais nova e a avó num apartamento de três quartos, com vista para um parque cuja grama nunca está suficientemente baixa.

    A diarista vem duas vezes na semana e nas duas costuma debater com o porteiro que diarista é empregada sim! e tem direito a todas as verbas previstas na CLT, assim, bem na cara do gordo, na certa para que conte à sua mãe para tomada de providências, como registro em carteira.

    Na sacada tem uma calopsita que já ganhou dois concursos nacionais.

    Já teve vários apelidos na escola, mas foi na oitava série que um pegou mesmo, de simplesmente Gordo virou O Gordo da Oitava.

    Quando um amigo arruma confusão, é só dizer vou chamar o Gordo, que a molecada se espalha que nem formiga em formigueiro pisado sem querer.

    Só não entende uma coisa o Gordo da Oitava: nunca brigou na escola, nem na rua, nem em lugar algum, portanto não sabe de onde veio essa fama de brigador, mas não acha ruim não.

    Toda quarta, que ninguém ouça, depois da novela das oito, prepara um escalda-pés para a avó.

    Odeia beijinho de coco e maître que pensa que é francês. Pensando bem, odeia os que são franceses também.

    Odeia segundas-feiras e sua banda favorita é Boomtown Rats, coincidência ou não, prefere I don't like mondays para ouvir no volume máximo (já gostou da banda RPM, mas hoje se arrepende).

    A mania de tanto reclamar da segunda lhe rendeu um presente inusitado no último aniversário: um livro intitulado O Homem que odiava a segunda-feira, de Ignácio de Loyola Brandão. O gordo achou engraçado (o título, porque até hoje não leu o livro) e pensou que um dia queria conhecer esse cara.

    Gosta da junção das palavras “aurora boreal” e já até pensou em escrever uma história com esse nome na aula de redação, mas ficou vermelho só de imaginar a leitura em voz alta na frente da classe, e o que é pior, da Maria Fernanda.

    Fato relevante: uma vez a tia o convidou para assistir a um filme, ele não gostou muito da idéia, “filme de mulher”, debochou em pensamento, “deve ser Titanic”, mas a tia havia recém-separado do marido e ele ficou com pena de dizer não.

    Era a história de um garotinho chamado Totó que ficara fascinado pelo cinema da pequena cidade onde morava, zzzzzzzz.... e desenvolveu uma bonita amizade com o velho projecionista local, zzzzzzzzz.... ia dormir, certeza.

    Acontece que aconteceu o que se imaginava inacontecível: o menino não despregou o olho da tela nem por um minuto, e umas cinco ou seis vezes segurou com força um gosto estranho que descia rasgando pela garganta, e como ótimo e improvisado disfarce tirou sarro da cara vermelha de sua tia, que enxugava os olhos com os últimos kleenex da caixinha.

    Ah, o filme? chamava Cinema Paradiso, assistiu muitas outras vezes.

    O fato é relevante porque quando o pai ordenou que arrumasse um emprego, logo pensou que queria trabalhar no cinema, era aquilo que queria, estava determinado assim como Totó, mas como ainda era muito novo para ser diretor ou algo assim, o mais próximo disso que conseguiu foi uma vaga de atendente na Blockbuster na esquina do prédio, e durante seis meses se apaixonou platonicamente por todas as meninas que levavam para casa os seus filmes prediletos [anos mais tarde, o gordo da oitava se tornaria um conhecido e ácido crítico de cinema, que julgava repulsivo o ato de comer pipoca num ambiente tão sagrado].

    Curiosidades: durante a infância foi viciado em mini-chicletes Adams, aqueles que sumiram do mapa depois dos anos oitenta.

    Uma vez, ao acompanhar os pais em uma entrevista no consulado americano, para obtenção de vistos para a primeira viagem à Disney, colou uma massaroca de chiclete debaixo daquela mesa de madeira escura, pernas bem torneadas e tampo de mármore, e a partir de então, durante muitos anos se divertiu colando bolas de chiclete debaixo de mesas chiques como aquela.

    Nunca se conformou que a Vovó Mafalda era na verdade um Vovô.

    No dia em que completou um ano de carteira de habilitação, quase atropelou Daniela Cicarelli numa esquina do Baixo Leblon.

    Escreveu um ensaio chamado A Aurora Boreal, numa velha Remington abandonada na área de serviço, que foi publicado num caderno especializado naquilo em que ele se tornou especialista (não me pergunte agora, que o nome é comprido).

    O apelido o seguiu pela vida afora, mas o gordo da oitava já não era mais gordo há muito tempo, aliás, desde a quinta série não era gordo.
    ...

    posted by Dedê Ranieri @ 12:47 AM |